Enocuriosos no Velho Mundo... Itália: Vignamaggio

Idas e Vinhas

Após termos almoçado no Castello de Verrazzano, chegamos à Vignamaggio por indicação das placas (e por sugestão do Alexandre). Chegando de supetão, não conseguimos mais do que ser bem atendidos pela simpaticíssima Cristine naquele fim de tarde. A visita com degustação, no entanto, foi agendada ali mesmo para o dia seguinte!


De volta à vinha, na manhã de domingo, fomos recepcionados novamente por nossa adorável anfitriã. Nosso grupo era bastante pequeno e isso propicia experiências bem bacanas e mais intensas, na maioria das vezes. Ademais, Cristine, além da simpatia que já havia demonstrado na tarde anterior, é muito espirituosa, tem grande desenvoltura e explica as coisas sobre a vinícola como quem bate um papo com o grupo, de forma muito natural e à vontade.

Idas e Vinhas

A vinícola está situada em uma das inúmeras e lindíssimas colinas da região – aquele visual de filme romântico que você jura ser um cenário artificial. Pois não é. Não há como não ficar entorpecido com a beleza dos jardins e toda a natureza clássica do local. Aliás, a Vignamaggio costuma organizar eventos e festas justamente explorando a área externa à casa principal. Após dar uma “voltinha” no jardim só para nos ambientarmos, começamos a visita pela parte externa, numa espécie de terraço que fica sobre as salas de vinificação. Ali, Cristine nos apontou o sentido de outras regiões viníferas da Toscana, os limites dos territórios Chianti e como as uvas colhidas iniciam o processo de vinificação ao ser despejadas dentro da bodega por escotilhas construídas naquela terrazza.

Em seguida, entramos de fato na linha de produção, onde avistamos os tonéis de aço inox e a máquina engarrafadora. Como ainda não estávamos na vindima, não foi possível ver o todo o processo funcionando, mas foi possível identificar que a Vignamaggio é uma vinícola, diríamos, de médio porte. Nossa guia fez questão de esclarecer em minúcias todo o processo de fabricação e os cuidados com a temperatura e manejo do fruto e do mosto. As fotos abaixo dão uma noção do tamanho das instalações.


Idas e Vinhas
O balé de Cristine: mais do que um simples guia.
Idas e Vinhas
Linha de engarrafamento.
Na seção seguinte, adentramos os porões que guardam os tonéis e barris de carvalho. Estes salões fazem parte da construção original que, segundo as estimativas da própria vinícola, começaram a ser edificados no século XIV. Neste momento a visita adquiriu uma característica única, pois a guia deixou de falar apenas sobre a produção do vinho e começou a explicar detalhes sobre a história daquele pequeno burgo.


Idas e Vinhas


Mesmo que nada fosse falado, seria muito fácil perceber que estávamos conhecendo uma espécie de palácio que faz parte da história daquela região (e que já viveu dias de glória em outra época), em vista do tipo da construção com suas paredes grossas e envelhecidas, o pátio com o poço interno, a fachada imponente e algumas insígnias. A cada novo ambiente era possível sentir (e imaginar) um pouco mais sobre a história do local e como era curioso poder estar ali em pleno século XXI, mesmo que por poucos minutos.

Idas e Vinhas

Em uma das salas que abrigavam grandes tonéis de carvalho, Cristine deu detalhes sobre uma das inúmeras invenções que Michelangelo deixou à humanidade (sim, além de exímio artista plástico, este gênio foi também grande inventor): explicou o que eram e qual a função dos artefatos de vidro colocados em cima dos tonéis. O nome do equipamento é colmatore e sua função é impedir que o ar se acumule nos tonéis em função da lenta e gradual reação gasosa e perda de pequenos volumes permitida pela madeira do contendor. Como a reação natural da perda de volume de líquido é o acréscimo de ar na parte de cima do tonel (e este ar atuará para oxidar de forma indesejada o vinho), o colmatore atua para preencher automaticamente (apenas com a força da gravidade) o volume de líquido que se perdeu e evitar a oxidação. Além disso, serve também como um indicador para que o responsável pela bodega preencha o equipamento com pequenas quantidades de vinho de forma a garantir que continue a agir como desejado.

Cristine nos contou que todas as vinícolas do Chianti Florentino utilizam este equipamento e se orgulham de fazê-lo. Visitamos outras bodegas e pudemos confirmar o que ela disse. Em Montepulciano pudemos ver, inclusive, a reposição do vinho neste curioso artefato.

Idas e Vinhas
Il Colmatore
Bem, a visita à Vignamaggio nos reservava outra particularidade: de uma das famílias que já foram donas desta propriedade surgiu a famosa senhora – La Gioconda – retratada por Leonardo da Vinci. O sítio virtual da vinícola explica esta história em detalhes mas não há nada melhor do que ouvir as explicações do guia lá na propriedade, podendo vislumbrar um pedaço da paisagem que faz parte do célebre quadro. Ficamos alguns bons minutos apenas ouvindo o detalhado e, porque não dizer, apaixonado relato de Cristine apontando sinais e correlações entre o quadro e a paisagem local que nós, enocuriosos e turistas, haveríamos de ignorar. Uma aula de história e delicadeza.

Idas e Vinhas

(Embora Cristine não tenha comentado durante o tour, gostaríamos de salientar que a Vignamaggio é também um agriturismo. Imaginamos que desfrutar de um par de noites por lá seja um mergulho ainda mais profundo na aura e história do lugar.)

Voltando ao nosso passeio, vamos tratar do gran finale. Como estávamos na companhia do Alexandre, o tour seguiu o rito normal, mas a degustação recebeu alguns acréscimos inesperados. Provamos mais vinhos do que teríamos direito numa simples visita. Nossa degustação continha os seguintes rótulos: Chianti Classico (safras 2011 e 2013), Chianti Classico Gran Selezione, Obsession, Cabernet Franc e, para encerrar, o Vinsanto. Neste link é possível verificar a ficha técnica de todos os rótulos da casa. Para nós, o Gran Selezione se destacou e o Cabernet Franc não acertou nosso coração (creio que por ainda não estarmos preparados para ele).

É "mais passeio" ou é "mais vinho"?

É mais empate. O tour, Cristine e a propriedade são únicos. Sentimos falta, entretanto, de visitar os parreirais e ouvir um pouco mais sobre os aspectos e peculiaridades da forma de produzir (e cultivar) escolhida pela vinha. Os vinhos mostraram-se corretos e... clássicos. É claro que isso não é um problema mas ficamos com uma pequeníssima frustração por não provar um rótulo algo arrebatador. Por isso o empate. Ainda assim, podemos afirmar que o diferencial é o passeio e a propriedade histórica do local. Veramente imperdíveis.

Saímos de lá quase sem saber o que fazer durante a tarde livre no Chianti – sorte nossa que todos os caminhos chiantigianos levam ao vinho, às vinhas e a boas e inesquecíveis histórias. Próxima parada – Chianti.

Idas e vinhas
Só há um caminho no Chianti...
Salute!

Enocuriosos
*fotografias de Dagô e Simone.

Gostou dessa postagem? Nossa viagem à Itália começou aqui.

Comentários